Correio Central
Voltar Notícia publicada em 26/02/2019

Delegado e agentes de RO recorrem no STJ de condenação por tortura do TJ/RO; estamos tranquilos

Delegado e dois policiais foram acusados de torturar preso acusado de participar da chacina que matou quatro cidadãos de Ouro Preto do Oeste.

A 1ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJ/RO) condenou a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos por três anos e ao pagamento de multa civil o delegado Cristiano Martins Mattos e os agentes Fernando dos Anjos Rodrigues e Eliomar Alves da Silva Freitas, sob a acusação de tortura que teria ocorrido quando estes atuavam na Delegacia Civil em Ouro Preto do Oeste, em 2012.

A sentença reforma a decisão em 1º grau do juiz José Antonio Barretos, de 2015, que havia julgado improcedente a denúncia de que os agentes da segurança pública do Estado teriam praticado tortura contra Adimar Dias de Souza, vulgo “Roliço”, acusado de envolvimento na chacina ocorrida no dia 5 de abril de 2012, em Buritis, que vitimou um policial civil, um agente penitenciário, um produtor rural e um taxista que presidia a Federação dos Taxistas de Rondônia (Fetaron).  

Todas as vítimas residiam em Ouro Preto do Oeste.

O MP/RO representou recurso de apelação contra a decisão que foi julgada no dia 7 de fevereiro deste ano pela 1ª Câmara Especial do TJ/RO, e a decisão publicada no Diário Oficial no dia 20, ultima quarta-feira.

A decisão cabe recursos, o delegado Cristiano Martins Mattos e os agentes Fernando dos Anjos Rodrigues e Eliomar Alves da Silva Freitas apelaram da decisão e entraram com recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A reportagem do site Correio Central entrou em contato em Brasília (DF) com a defesa dos acusados que os representa junto ao STJ. A defesa afirma que respeita a decisão do TJ/RO, mas considera a reforma de sentença equivocada, que os policiais civis agiram com base na legalidade e não se envolveram no caso para cometer crime nenhum.

O delegado Cristiano Mattos, que continua dando expediente normal na Delegacia Especializada na Repressão de Crimes Contra a Vida (DERCCV), em Ji-Paraná, não quis falar sobre a decisão do TJ/RO; ele limitou-se a afirmar que está confiante na decisão final da Justiça. “A gente está tranquilo, não fizemos nada. Ainda cabe recurso, inclusive no Tribunal de Justiça. Estou trabalhando normalmente, bastante tranquilo e a vida que segue”

ENTENDA O CASO:

Chacina ceifou a vida de quatro ouro-pretenses; delegado e 2 agentes foram acusados de torturar acusado

Adimar Dias de Souza, o “Roliço”, foi preso acusado de envolvimento na chacina ocorrida na Linha C-34, a 15 Km’s de Buritis, no dia 5 de abril de 2012, que vitimou o policial civil Renato de Jesus Pereira, o “Renatão”, o agente penitenciário Pablio Gomes de Sales, ambos lotados em Ouro Preto do Oeste, o pecuarista Moises Rosa Gomes e Ilton Ferreira de Souza, o “Barbante”, que presidia a Federação dos Taxistas de Rondônia (Fetaron).

Duas semanas após a chacina, havia contra Adimar um mandado de prisão temporária da comarca de Buritis, por suspeita de participar da matança, ele foi preso em Novo Horizonte e entregue ao delegado Cristiano e aos policiais na chegada de Ouro Preto do Oeste, pouco depois foi levado ao Hospital Municipal com crise convulsiva, e no outro dia foi transferido para Porto Velho.

O delegado e os policiais foram denunciados por organizações de trabalhadores rurais e pela Secretaria Nacional dos Direitos Humanos por tortura, foram condenados a primeira vez em 2014, mas foram absolvidos no TJ, conforme Acordão publicado em 5 de dezembro de 2016.

Na primeira absolvição, do Acordão publicado em 05 de abril de 2016, o Desembargador Valdeci Castellar Citon, relator do Acórdão, no seu despacho arguiu que “A existência de múltiplas hipóteses que explicam o estado clínico da vítima e a ausência de prova técnica firme a indicar que a causa das lesões nela encontradas originou-se de ato comissivo dos réus, não autoriza a condenação, em atenção ao princípio do in dúbio pro reo”, dando provimento à apelação da defesa.

A Desembargadora Marialva Henriques Daldegan Bueno, em seu relatório final de voto, citou que a denúncia que a vítima ficou em poder dos acusados por duas horas, contudo todas as provas constantes nos autos indicam que ele ficou sob a cautela dos denunciados por 10 a 15 minutos. Na denúncia, consta, ainda, que Adimar foi submetido a asfixia com sacos plásticos e afogamentos, chutes, tapas que deixaram lesões no supercílio e região escrotal e ferimentos na uretra, circunstancias que não guardam relação sequer com a prova indiciária.  

No despacho da Magistrada, ela mencionou que a vítima após se recuperar da convulsão narrou que foi barbaramente torturado por policiais em lugar que acreditava ser a delegacia de polícia, contudo, não há sequer um depoimento isento narrando isso, apenas a suposição de uma irmã de Adimar; ela também considerou que embora existam alguns indícios da prática de alguma ação que levou o paciente ao quadro clínico (de convulsão), a prova dos autos é nebulosa, não autoriza a confirmação da sentença, e a Desembargadora votou também pela absolvição dos policiais por insuficiência de provas.

ENTENDA O CASO

Adimar Dias “Roliço” tinha mandado de prisão temporária da Comarca de Buritis sob a acusação de ter participado com um grupo de pistoleiros da chacina que ceifou quatro vidas, ele foi preso no dia 23 de abril daquele ano em Novo Horizonte, e trazido por policiais militares até a entrada do morro Chico Mendes, onde foi entregue ao delegado Cristiano Mattos e aos dois policiais civis. Como o preso passou mal, e chegou ao Hospital Municipal com crise convulsiva, familiares do suspeito e movimentos ligados a luta pela terra denunciou que ele foi torturado, e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos exigiu investigação e punição para o delegado e os policiais.

Por causa da denúncia, o delegado e os policiais primeiro foram afastados dos respectivos cargos em 2015, e em sentença proferida pelo juiz Haruo Mizusaki em 31 de março de 2016, com base na acusação formulada pela Promotoria de Justiça de Ouro Preto d’Oeste, foram condenados à prisão e a perda dos cargos que exercem.

À época, o advogado Alexandre Anderson Hoffmann recorreu da sentença em 2ª instância e o delegado e os agentes foram absolvidos pela 2ª Câmara Criminal do TJ/RO.

A acusação é A de que, Roliço foi preso em Novo Horizonte e entregue ao delegado Cristiano e aos dois policiais fora de Delegacia e sem o cumprimento das normas legais atinentes a mandado de prisão.

Roliço teria sofrido grave tortura dentro de um veículo picape Strada, mas a defesa pontuou que não foi considerado o argumento da autoridade policial que, se o acusado fosse levado à Delegacia da cidade, poderia ser linchado, tendo em vista que familiares e populares sabiam da sua prisão e aguardavam a chegada dele.

Outra acusação foi a de que o delegado não tinha permissão para atuar no caso, porém em depoimento à época, o ex-secretário de Segurança, o delegado da Polícia Federal Marcelo Bessa, afirmou que autorizou Cristiano Mattos a diligenciar e investigar a chacina que ceifou a vida de quatro ouro-pretenses. Médicos, enfermeiros, policiais militares e pessoas envolvidas na detenção, internação e tratamento de Roliço também depuseram no processo.

Familiares das vítimas e populares fizeram protestos a favor do delegado e os policiais em frente o MP

Depoimento importante que contribuiu na absolvição dos acusados foi do médico Pauzanes Carvalho Filho que declarou em juízo, que o paciente Adimar chegou ao hospital em coma e, em sua estada, teve a oportunidade de acompanhá-lo durante alguns plantões. Após deixar o hospital, Adimar o procurou para consulta, na cidade de Ji-Paraná, e chegou ao consultório caminhando e falando fluentemente, o que o surpreendeu, pois é algo incomum na medicina, que exerce há mais de 35 anos.

De acordo com a defesa, com relação ao motivo da crise do acusado detido, nos autos do processo consta também o depoimento do avô de Adimar relatando que ele era submetido a tratamento de hepatite e que, inclusive, a esposa dele faleceu em decorrência dessa moléstia. No entanto, o depoimento de uma médica de Porto Velho que relatou do inchaço no cérebro do paciente Roliço, que poderia ter sido causado por asfixia ou enforcamento. 

Outro ponto importante no despacho da Desembargadora do Acordão de 2016, favorável pela absolvição, foi o depoimento das enfermeiras, técnicas de enfermagem e médicos que tiveram contato com o paciente, ainda na cidade de Ouro Preto do Oeste, e foram unanimes em afirmar que Adimar apresentava apenas duas lesões, um pequeno corte no supercílio e uma leve equimose atrás da orelha direita, e não foi relatada alguma lesão característica de constrição de seu pescoço, que conotasse asfixia, conforme a denúncia.

Ainda segundo o advogado de defesa, além da fundamentação que deu lastro ao petitório recursal, todos os pontos da sentença condenatória foram exaustivamente combatidos em sustentação oral junto ao Colegiado de segunda instância, culminando com a absolvição dos policiais no primeiro julgamento.

Fonte: www.correiocentral.com.br

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