Correio Central
Voltar Notícia publicada em 14/10/2013

Procurador do MPF escreve artigo do Dia do Professor: "Uma Lição de Amor"

Assim, a categoria mais mal remunerada do país (considerando uma série de fatores, sobretudo o valor da sublime missão que desempenham os professores, a impor correspondente remuneração digna) não raro tem que pagar para trabalhar.

Dia 15 de outubro é Dia do Professor. Todo mundo sabe disso.

 

O que, provavelmente, poucos sabem são as razões pelas quais tão importante celebração acontece nesta data.

 

O registro histórico remonta a um decreto imperial de D. Pedro I, datado justamente de 15/10/1827. Posteriormente, nos anos de 1940, iniciou-se em São Paulo uma celebração, bem no dia 15 de outubro, que viraria tradição. Naquele ensejo, o Professor Salomão Becker, um dos organizadores, teria dito: “Professor é profissão. Educador é missão”.

 

Poderíamos até ir além e dizer que se trata de verdadeiro sacerdócio, seja pelo caráter sublime, seja, sobretudo, pelos obstáculos cada vez maiores.

 

Apenas por um decreto de 14/10/1963 a data foi, finalmente, consagrada à justa e legítima celebração. Demasiadamente justa. Demasiadamente legítima.

 

De uma forma geral, os países reverenciam o Dia do Professor e, embora consagrem datas bem diversas, todos os Estados tendem a enaltecer bastante a figura dos mestres.

 

Na Índia, por exemplo, há um ditado que coloca o professor em terceiro (“a mãe, o pai e o professor é Deus”). Tamanha é a reverência que outro diz assim: “Eu estou com dificuldade de saber quem saldar primeiro: o professor ou Deus. Eu escolherei o professor porque ele é o instrumento da sabedoria do meu Deus”.

 

Na Turquia, Kemal Atatürk, que dedicou a data de 24 de novembro aos professores, declarou que “aquela nova geração seria criada por professores”.

 

O dia de nascimento do modelo de mestre e educador da China antiga, Confúcio, foi a data escolhida por Taiwan para reverenciar os professores (28 de setembro). Nesse dia, presta-se “homenagem às virtudes, dificuldades dos professores e também às suas contribuições não apenas em relação aos seus próprios alunos, mas também para com toda a sociedade”.

 

Perfeitamente adequadas todas essas homenagens. Ser professor está, seguramente, entre um dos três mais nobres ofícios que existem.

 

Deveria ser comemorado, não apenas no dia 15 de outubro, mas ao menos nos duzentos dias letivos exigidos pelo calendário escolar.

 

Houve um tempo em que havia grande respeito, no Brasil, pela profissão. O professor gozava de enorme prestígio e autoridade. Ai de quem ousasse desrespeitar os mestres. Indagadas, as meninas elencavam a carreira como uma das preferidas que seguiriam (ao lado de aeromoça, médica, atriz).

 

Ai que saudade daqueles tempos, que nem estão muito distantes, não. Coisa de vinte ou trinta anos atrás.

 

Hoje em dia a profissão não é respeitada como deveria ser. Não raro se escuta, com grande tristeza, dizer que algum aluno brigou com o professor ou mesmo lhe furou o pneu do carro; isso quando há um carro...

 

Hoje não são incomuns os casos em que muitos professores têm até vergonha de dizer que desempenham profissão tão nobre. Onde deveria haver orgulho e altivez há pudor e constrangimento.

 

O drama chegou a tal situação limítrofe que custa acreditar que existe um mandamento constitucional que manda valorizar os profissionais da educação escolar.

 

As razões pelas quais uma profissão de tamanho relevo para a família, a sociedade e o Estado ter reduzido, de forma tão drástica e célere, seu prestígio mereceria estudos e teses dos mais letrados.

 

Atreve-se, não obstante, a dar um modesto palpite a respeito.

 

O professor, a educação como um todo decaiu como muitos outros valores relevantes da sociedade, como a família e o casamento, tiveram sua importância diminuída.

 

Mais difícil que entender tamanha redução de importância é tentar recuperá-la, mormente no Brasil, que se preocupa apenas em maquiar os números horríveis que temos na educação, que rivalizam com os indicadores de países paupérrimos do globo terrestre.

 

Sinceramente, não se enxerga a mais mínima preocupação desse ou dos últimos governos em valorizar, efetivamente, o professor. Quisera estar redondamente enganado a respeito.

 

O professor é um segundo pai, assim como a escola, uma segunda família.

 

Os professores e as escolas relutam, não sem razão, o quanto podem, a reconhecer tamanha deferência, que implica enorme responsabilidade.

 

Mas é assim mesmo, queiram eles ou não. Principalmente em tempos de comunicação global e das mulheres trabalhando e assumindo, felizmente, sua justa posição no casal e na família, os professores funcionam, ou devem funcionar, como verdadeiros segundos pais.

 

É bom que seja assim. Professores comprometidos com valores éticos e morais podem ter influência decisiva na formação do caráter de crianças e adolescentes. A contribuição inestimável pode significar a diferença entre um adulto que seja verdadeiramente uma pessoa de bem e... um adulto.

 

Para se lhe exigir tamanha responsabilidade na família, sociedade e Estado, o professor, obrigatoriamente, tem que ser valorizado. Pelo Estado, pela sociedade, pela família.

 

Embora o dinheiro não seja tudo, nem o mais importante; embora existam outras formas até mais baratas de reconhecimento; a valorização precisa começar por atribuir à categoria um salário decente.

 

Difícil exigir de um professor pai de família, que ganha menos de um salário mínimo (realidade ainda existente no Brasil) que cuide, não apenas dos seus, mas também dos filhos dos outros.

 

Existe professor universitário com pós-graduação ganhando menos que motorista e balconista! Nada contra motoristas e balconistas. O trabalho é sempre uma virtude, seja ele qual for – e precisa ser valorizado mesmo. Mas, numa escala de valores...

 

Mesmo num cenário tão adverso, muitos professores ainda desempenham seu ofício com grande entrega.

 

Muitos deles até tiram dinheiro do próprio bolso! Feliz ou infelizmente, não é incomum ver professores arcando com despesas para a Páscoa, o Dia das Crianças ou mesmo até com material didático-pedagógico para melhor ensinar.

 

Assim, a categoria mais mal remunerada do país (considerando uma série de fatores, sobretudo o valor da sublime missão que desempenham os professores, a impor correspondente remuneração digna) não raro tem que pagar para trabalhar.

 

Tamanho paradoxo, inconcebível para tantos, só se justifica pela verdadeira devoção com que muitos mestres encaram seu trabalho.

 

A considerar, como se considera mesmo, a educação como a mola propulsora do desenvolvimento e evolução de um povo, os professores encarnam, assim, esperanças de dias mais felizes. São os timoneiros de um Brasil melhor.

 

Assumam, então, queridos mestres, com grande regozijo, tamanha responsabilidade. Lembrem-se que os ventos da mudança passam também por vocês.

 

Continuem ensinando bem. Ensinem com amor. Persistam com fé de que dias melhores virão para a educação, para o país, para todos nós. No caminho, estejam alegres na esperança, pacientes no sofrimento.

 

Por Reginaldo Trindade - O autor é Procurador da Repúblicado MPF/RO. Especialista em Direito Constitucional.



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